E aproveitando a época, pensamos aqui sobre o que falar. E decidimos trazer um pouco de uma das facetas do Jesus histórico: o Ativista Político. É isso mesmo que você leu, POLÍTICO. Bora lá então?
"Nhai, não pode misturar religião com política!", vocês já podem pensar. Mas calma, esse assunto não está sendo tirado do puro achismo e do nada, já vem sendo debatido há anos por acadêmicos do mundo todo. E é até bom saberem da existência dessa hipótese pois aí param DE UMA VEZ POR TODAS de achar que não se tem política nas coisas. Viver é um ato político, ô @&!*#($)! (Desculpe, me exaltei aqui =P).
A ideia desse texto não é implicar com a fé de ninguém, nem dizer no que você tem que acreditar. O que a gente quer aqui é mostrar alguns pontos de vista sobre o tão falado Jesus histórico e como era o seu tempo e a sua vida. Afinal, fé é fé. Cada um tem a sua, que é muito pessoal e vai além de tudo isso aqui.
___ ישו מנצרת
A 1ª coisa que precisa ficar muito clara na sua cabeça é que Jesus, caso tenha existido mesmo, era um JUDEU. PONTO! Ele vivia na Palestina, falava em aramaico e seguia as tradições da Torat Moshé - que literalmente quer dizer A Lei de Moisés. Sua pele era escura, cabelos e barbas escuros, encaracolados/crespos, e fazia parte da força trabalhadora - não chegava ser de todo pobre, tinha lá seus confortos e riquezas. Ele era sim um homem do seu tempo.
E cabe aqui um panorama geral do que estava acontecendo naquela época do nascimento. A Palestina estava sob o reinado de Herodes, o Grande, vassalo do Império Romano. Ao morrer, o reino foi dividido entre seus 3 filhos: Arquelau (que mandava no canto sul da Judeia e Samaria), Felipe (a leste do Jordão) e Herodes Agripa (Galileia e Transjordânia). Herodes Agripa era o real herdeiro, considerado vice-rei. Porém de nada importava, pois o imperador Cláudio Augusto não nomeou nenhum deles como Rei dos Judeus, deixando o cargo vago (lembre-se disso, será importante mais pra frente).
___ Partidos/Seitas
No mundo judaico não havia distinção entre política e religião. Questões como política, sociedade, economia e religião eram todas consideradas em termos de Yahveh e sua Torat. Por isso, no mundo daquela época as posições políticas tinham tudo ver com as interpretações religiosas.
Existiam 4 "partidos" principais em operação: os Fariseus, os Saduceus, os Essênios e os Zelotas. Falar sobre cada um deles daria pano pra manga, por isso vamos falar um pouco por cima das suas características mais importantes.
Fariseus: do hebráico prushim, de raiz parash, que basicamente quer dizer "separar", "afastar". Ou seja, os que se afastaram. E não por devoção e estudos, mas sim por se acharem superiores. Não ostentavam riquezas e acreditavam numa recompensa após a morte. Apesar de seguir a lei escrita, a base de suas ideias era pela Lei Oral, que foi passada por Yahveh. Por isso acreditavam que a tradição era tão importante quanto a escrita. Eram chamados de hipócritas, já que por terem em julgo a Lei Oral, por vezes ignoravam a Lei Escrita.
Saduceus: do hebráico Ṣĕdûqîm bnê Sadôq, "zadoquitas" ou "sadoquitas", sendo (em uma das teses) seguidores de Zadoque, sucessor do exilado Abiatar - um dos conspiradores contra o trono de Salomão a favor de seu rival, Adonias. Os Saduceus abominavam a Lei Oral, não acreditavam na recompensa após a morte, e achavam que o messias não era uma pessoa em si, mas um estado/modo de viver. Muito ricos e soberbos, faziam parte uma longa linha de sacerdotes, um cargo passado de pai para filho. Diziam que apenas um deles poderia ser o messias e eram próximos de Roma, aceitando o seu domínio, contanto que continuassem fazendo parte da classe sacerdotal.
Essênios: a origem do nome ainda é muito debatida, mas sabe-se que eles pregavam a fé em sua forma mais pura e abstêmia. Se isolavam em comunidades fechadas longe, pois achavam que os outros se perderam da Lei. Tinham uma certa compulsão à purificação, saindo daí a ideia do batismo pelas águas. Quase não se casavam, e quando sim mal, se permitiam aos prazeres e contatos, já que o foco da vida era viver a Lei. Totalmente contra os romanos e seus sacerdotes, é deles a provável origem dos Manuscritos do Mar Morto. O mais famoso desse grupo é o primo de Jesus: João, o Batista.
Zelotes: do hebraico kana'im, que literalmente significava "os zeladores", aqueles que guardavam e zelavam a Lei de Moisés. Mas assim, guardavam com fúria e extremismo! Foi estabelecido pelo líder revoltoso Judas, o Galileu. Não aceitaram a reforma tributária criada pelo governador romano na Síria, Quirino, gerando assim inúmeras revoltas violentas contra o império. Tão abominável era a ideia de pagar tributo a Roma que preferiam o suicídio do que se submeter. Eram a principal frente de combate para a libertação da nação.
___ Voltando…
O nascimento de Jesus já é uma controvérsia grande. Os evangelhos de Marcos e João, os mais antigos escritos, mal mencionam esse acontecimento. Esse trabalho ficou para os evangelhos de Mateus e Lucas, os mais "fantasiosos", que contam quase que em detalhes o que aconteceu. Sabe-se que foi numa época de rebuliço político muito grande da parte dos Judeus com o Império, principalmente por conta dos Zelotas e da nova reforma tributária de Quirino.
José não era um carpinteiro de fato, segundo alguns estudiosos, mas algo como um construtor civil, não tendo uma função exata. E por conta disso, ficava pra cima e pra baixo trabalhando, mas tendo residência fixa em Nazaré, na Galileia, lugar de onde as principais revoltas começaram a estourar com Judas Galileu e os Zelotas. Tanto que, por volta de 6 d.C., Judas Galileu partiu pra cima dos romanos, mas foi derrotado - e não se sabe o que aconteceu com ele após isso.
Como a tradição da Lei ordenava, todo ano os Judeus deveriam peregrinar para o Templo na Páscoa, e com a família de José não seria diferente. Então, é totalmente crível que o menino Jesus conviveu com os Zelotas e os Essênios - tanto que seu primo João era um deles. E essa relação teve uma influência muito grande em sua formação ideológica. Sem falar que, no caminho, ele poderia muito bem ter encontrado outros núcleos políticos. Tanto que é relatado seu interesse e devoção pelos assuntos já aos 12 anos, no episódio dos doutores da Lei no Templo, dentre eles os próprios Saduceus. (Detalhe, Maria e José foram embora e esqueceram o menino lá. =D )
___ Mashiach
Apesar de algumas diferenças entre as visões do Torat pelas seitas, a vinda do messias é unânime. Messias quer dizer "o ungido", e as profecias sempre falaram sobre ele, tendo mais força depois da dispersão do povo com a queda do Reinado e do Templo pelos Babilônios.
A ideia principal das profecias é que um homem ungido da semente de Davi reunificaria todos os judeus em um único território, sob uma mesma coroa e uma mesma Lei. Não, não era metafórico como depois veio a ser com o Cristianismo. Era no sentido literal, um reino físico na Terra.
Tem uma variação do tema que o messias viria da semente de Aarão, irmão de Moisés, que teria um cunho mais sacerdotal, porém o reino físico ainda seria o mesmo. Devemos entender que para os judeus não há outro ser divino que não Yahweh, o único, indivisível, e que jamais encarnaria na Terra. Nem ao menos uma fração de seu poder tomaria forma física. O messias deverá ser totalmente humano, casar, gerar descendentes de Davi e morrer - mas não antes cumprir toda a tabelinha de profecias.
E aqui acaba a 1ª parte. Amanhã tem mais…